A seletividade da política externa brasileira
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  • 24/09/2025

A seletividade da política externa brasileira

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Créditos: Agência Gov

      O presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou ontem à tribuna de abertura da Assembleia-Geral da ONU pela décima vez, exibindo a autoconfiança que lhe é característica. Seu discurso revelou mais uma vez a contradição fundamental de sua política externa: de um lado, o estadista que denuncia corretamente medidas unilaterais e sanções arbitrárias impostas pelos Estados Unidos, que de fato atingem a soberania brasileira e prejudicam a economia; de outro, o militante que se refugia em chavões contra o “imperialismo ocidental” e reproduz um vocabulário gasto de terceiro-mundismo ideológico. O efeito é que o Brasil não se apresenta como um mediador confiável, mas como ator parcial, reduzido à função de porta-voz de uma facção política.

      Na parte mais consistente do discurso, Lula apontou com razão que nenhum governo estrangeiro tem o direito de manipular tarifas ou o sistema financeiro como instrumentos de coerção política, como tem feito Donald Trump ao retaliar o Brasil. Nesse ponto, sua contundência é bem-vinda e atende ao interesse nacional. Mas, ao lado dessa nota de firmeza, predominou o velho estilo: demagogia contra os males universais da fome e da desigualdade, sem apresentar soluções práticas, apenas repetições retóricas que rendem aplausos fáceis.

     Mais eloquentes foram as omissões. Sobre a guerra na Ucrânia, Lula limitou-se a duas linhas protocolares, evitando nomear a Rússia como agressora, como se houvesse simetria entre invasores e invadidos. Essa falsa neutralidade é, na prática, cumplicidade. Sobre Gaza, o inverso: menção constrangida ao Hamas e verborragia contra Israel, tratado como culpado absoluto. Os crimes de guerra do terrorismo islâmico foram minimizados, enquanto cada reação israelense foi maximizada e classificada como “genocídio”. Esse duplo padrão não é acaso, mas método. Quando se trata de autocracias amigas — Rússia, Irã, Venezuela, Cuba — Lula adota silêncio ou indulgência; quando o alvo são democracias ocidentais, vem a indignação moralista.

        A seletividade da política externa petista tem custos reais. Para investidores, parceiros comerciais e governos que exigem previsibilidade, o Brasil transmite insegurança. Ao relativizar crimes de guerra e legitimar regimes autoritários, o País perde credibilidade como mediador e confiança como parceiro econômico. E, internamente, a retórica da ONU reflete a prática doméstica: instrumentalização de instituições, tolerância com abusos e confusão entre democracia e hegemonia. Em vez de reforçar a estabilidade democrática, o governo projeta para fora a mesma lógica faccional que corrói a política nacional.

      Essa seletividade não é inofensiva. Ela mina contratos, afugenta investimentos e projeta ao mundo a imagem de um Brasil pouco confiável. No plano interno, reforça a confusão entre democracia e hegemonia partidária, enfraquecendo o equilíbrio institucional que deveria proteger a pluralidade e a liberdade. O resultado é a erosão simultânea de nossa credibilidade econômica e de nossa estabilidade política. Ao transformar a vitrine da ONU em palanque, Lula pode ter agradado plateias simpáticas, mas reduziu a estatura internacional do Brasil e expôs o País ao risco de pagar caro por escolhas ideológicas.

Por Mateus Wesp